sábado, 22 de setembro de 2012

Capítulo 18 - O excêntrico raptor


Fomos guiados por um extenso corredor claro, ao qual havia, no final, uma porta dupla espelhada.
Pude ver, antes que ela se abrisse, como meu ferimento estava realmente feio. Sentia a perna latejar, mas o raspão não impedia que eu pudesse andar ou... Pisar em pés de grandalhões. Precisava fazer alguma coisa, e rápido. O risco de infecção era iminente.
Não me detive muito nesse pensamento, pois as belas portas foram abertas por dentro, por dois oficiais, ao ouvirem o comando de Brutus.
Entramos, acorrentados, um após o outro, e nos vimos diante de uma ampla sala, que parecia a sala de um hotel de luxo. Sofás de veludo, um lustre esplendidamente belo, revistas na detalhadamente esculpida em madeira mesa de centro, pilares que copiavam os designs gregos, paredes alvas como a pele de Branca de Neve jamais poderia ter sido, e um carpete amarronzado. Um bar à esquerda, e uma parede, ou melhor, uma janela que tomava o espaço de toda uma parede. Não pude identificar onde estávamos, pois estava escuro. À frente dessa janela, uma escrivaninha muito bela, entalhada em mogno, extremamente grande, com uma enorme cadeira com o encosto alto voltado para trás.
– Chefe, aqui estão eles. Todos.
Alguém atrás do encosto da cadeira respondeu:
– Ótimo! Perfeito! Estão todos aí? – falou uma voz cínica, andrógina, em tom calmo e ao mesmo tempo ameaçador, mas com um toque otimista.
– Sim, mestre! – Respondeu aquele baixinho narigudo.
– Maravilha! Bem-vindos, meus hóspedes! – e a cadeira se virou, revelando-nos um homem alto e magro, de cabelo metido a Chitãozinho e Xororó nos anos 80, usando um terno creme, com camisa e gravatas ambas alvíssimas como as paredes. Tinha um rosto bem fino e um nariz muito grande e curvado. Olhos castanhos ostentavam acima de si sobrancelhas grossas e ligeiramente grisalhas, como os cabelos escuros. Os lábios finos e secos curvavam-se num meio sorriso sarcástico e simpático simultaneamente, se isso é possível. A barba rala e também grisalha dava-lhe o aspecto final de um suposto empreendedor. Mas, havia um detalhe: ele era, pois, muito, mas muito feio.
– Oh, estão todos aqui! – Ele pegou um lenço e começou a enxugar uma pequena lágrima, como se estivesse emocionado. – Oh, meus queridos, há muito tempo os espero!
Todos encarávamos a ele sérios, as expressões impassíveis.
– Meus ídolos... Digam alguma coisa! – Ele sustentou um sorriso sofrido, os olhos enrugando-se da expressão de forma aguda, mais um sinal de seus aparentes quarenta e nove, cinquenta e poucos anos.
– Que temos a dizer? – falou Barry. – Estamos aqui contra a nossa vontade, viemos desconfortavelmente e com suprimentos escassos em um avião, fomos tirados de nosso conforto e vida tranquila, para sermos trazidos a... isto!
O homem fechou a expressão. Torceu o pescoço duas vezes, como num tique nervoso. Todos sentimos nossos membros enrijecerem. O que atiçara tamanha fúria no homem? O que seria de nós agora? Todos imaginávamos o que nos aconteceria em seguida, enquanto o rosto dele ficava vermelho, irado, e poderiam sair faíscas de seus olhos.
– ROBIM!
Mas...
– Robim... Seu incompetente! Não alojou-os confortavelmente, como eu lhe pedi! – ele mal conseguia falar. Atropelava suas palavras, tamanha à ira com que as cuspia na cara do baixinho narigudo.
Um suspiro de alívio tomou conta geral de mim e meus companheiros. O mesmo não acontecia com o tal Robim, infelizmente para ele.
– Desculpe mestre! – Havia um medo e um aborrecimento em seus olhos.
– Sua besta inescrupulosa odiosamente burra! – ele apontou o dedo para Robim. – Cale-te, e vá para o canto!
Robim abaixou a cabeça.
– Sim... mestre... – E, chorando, foi até o cantinho da sala.
– Ah, gente burra me irrita! Mas – ele mudou de expressão, parecendo simpático novamente. – Não vamos nos preocupar com esse tipo de gentalha. Ah, vocês não fazem ideia do quanto é honrosa sua estada em minha humilde sala!
Aquela ladainha toda estava me incomodando. Quando percebi, já tinha soltado, de maneira nem um pouco educada, as seguintes palavras:
– E quem é você, por acaso?!
O homem virou-se para mim, a expressão fechando-se. Examinou-me da cabeça aos pés, e novamente sua expressão mudou-se, dessa vez, para uma de desdém.
– Eu é que deveria lhe perguntar quem é, senhorita, pois não a conheço. Não é famosa, certamente.
Ele tinha razão. Com certeza eu não era nenhum ídolo mundial.
– Gente metida à famosa é fogo! – Ele revirou os olhos. – ROBIM!
O baixinho narigudo reaproximou-se dele receoso.
– Quem é essazinha? –Ele tornou a perguntar. Fiquei profundamente irritada.
– Bem mestre... Ela estava com o garoto, e viu tudo, inclusive o helicóptero. Tentaram eliminá-la, mas sem sucesso. A única solução foi trazê-la, segundo os rapazes contaram, antes que a polícia aparecesse.
– E por que ainda não deram um fim nela depois disso? – Perguntou o homem impaciente.
– Bom... é... bem... é que... sabe... que... eu... Tá! Eu não sei! Não precisa ficar me encarando desse jeito! – E ele soltou lágrimas, indo para o canto da sala novamente.
– A moça já causou estrago, chefe... – Falou o outro brutamontes, que não era Brutus.
– Como assim, Tvailler?
Brutus deu um passo à frente e mostrou o ferimento em seu pé.
– Oh, Meu Deus! – O homem deixou escapar um gritinho agudo. – Vá fazer alguma coisa para melhorar isso Brutus! – Dizendo isso, voltou-se para mim novamente, dessa vez a alguns centímetros de meu rosto, olhos nos olhos. – Você é inútil aqui, minha cara, pelo menos por enquanto. Escute bem, ainda está viva por sorte, e quão sortuda você é! Até eu decidir o que vou fazer com você, é bom não me dar motivos para não me arrepender de não mata-la agora mesmo!
Engoli em seco, mas não ousei responder.
Ele lentamente virou-se de costas, dando alguns passos à nossa frente.
– Mas está certa, em um aspecto. Ainda não me apresentei oficialmente. – Ele fez uma pausa dramática, e girou, para encarar-nos enquanto elevava o tom de voz para dizer – Eu sou EUSÉBIO MATTOSO, o maior artista deste planeta! – Ele soltou uma gargalhada diabólica em seguida. – HAHAHAHAHA... COF, COF! – Mas parou-a engasgando.
Robim rapidamente lhe trouxe uma jarra de água.
– Obrigado, inútil. Continuando... – ele cerrou os olhos por um segundo, em um deleite maleficamente desgostoso. – Não façam essas carinhas... Eu AINDA não sou conhecido. Mas, vocês irão me ajudar a alcançar meu sonho.
– E como faremos isso, meu caro? – Dessa vez Steven Tyler foi quem ousou.
– Oh, Sr. Tyler, para isso vou fazer uma breve retrospectiva de minha vida. – Eusébio foi até o balcão do bar, pegou um controle remoto e apertou um botão. À nossa esquerda, uma painel desceu. Ele apertou outros dois botões, a luz se apagou, e imagens começaram a passar na tela.
– Vejam como eu era pequeno... Uma criança bela e saudável, recém-nascida no colinho de minha mãe... – Ele enxugou algumas lágrimas que saíam do canto de seus olhos.
“Eu fui crescendo uma criança feliz, mas meus pais ficaram preocupados, pois um ano e meio passou sem que eu soltasse uma palavra... Eles foram a vários especialistas, os melhores que o inesgotável dinheiro de meu pai podia pagar, que disseram que eram normais algumas crianças que demoravam a falar... Mas, depois, quando eu fiz três anos, ainda emitia apenas grunhidos, e meus pais faziam de tudo para que eu desenvolvesse a fala... Eu me lembro de seus esforços, mas eu simplesmente não tinha vontade nenhuma de conversar ou falar... Até que, próximo dos meus quatro anos, eu ouvi. Ouvi uma música no rádio que me encantou tanto, mas tanto, que... Bem, eu a cantei. Meus pais, maravilhados, viram-me a partir daí desenvolver o hábito social primordial. A música, a música sempre foi tudo em minha vida! E eu cresci com ela. Ali eu estava cantando em meu quarto, aos seis anos, e ali, na cozinha para meus avós, ao sete, e ali... ROBIM! O que uma foto sua na banheira está fazendo aqui?! Santa ignorância! Inútil, não sabe nem montar um vídeo...
Mas, continuando... Infelizmente, a voz infantil deu lugar à voz de um garoto, e depois de um homem... E eu abomino essa voz pela qual sou dotado. Desafina ela, e muito, e não tem um tom característico. Fui expulso de audições, e Simon Cowell deu-me um veredicto que jamais poderei esquecer... Tentei algo em que eu estivesse então, pelo menos, em contato com a música... A dança! Mas sou tão desajeitado e desgovernado com meus movimentos como com minha voz... Sou um desgraçado!
Assim sendo, tive de buscar outra profissão, e segui carreira como engenheiro bioquímico e de produção. Meus colegas zombavam de minha feiura e desajeitamento, mas eu não ligava, pois não foi em vão que escolhi ambas as carreiras! Uma vez formado na universidade, construí este imenso laboratório em que estão agora com a poupança que meu pai acumulara para mim mais a sua herança, quando ele, pobrezinho, faleceu. E com o capital restante, construí a maior, mais perfeita, mais maléfica, mais... mais TUDO máquina de todos os tempos! A MÁQUINA DOS TALENTOS!”.
Uma imagem da máquina apareceu na tela. Era do tamanho de um homem, muito estranha, com uma espécie de pistola manejável projetada para frente.
– Ela funciona com botões e um gatilho, mais um toque de radiação alfa. Posso escolher o talento que quero e digitar no monitor que ela tem atrás da pistola, mirar e, acertando o alvo, a radiação emitida fica contida numa câmara especial, com o talento desejado. Baseei-me em princípios de tecnologia nazista perdida, que secretamente encontrei. Com esta coisinha, arrancarei todos os talentos de cada um de vocês, e os incorporarei à minha pessoa, para me tornar, no final, o maior artista do planeta! Uah-Hahahahaha... Cof, Cof... – Ele sorriu maliciosamente.
– Haha, isso nunca vai funcionar! – Exclamou Harry, até então quieto. – É impossível uma máquina dessas existir!
Ele olhou docemente para Harry.
– Quanto mais jovem, mais inocente... Pois essa máquina existe, e funciona! Apliquei uma pequena quantidade uma vez em Brutus e Robim. Brutus perdeu um pouco de sua voz, e Robim engrossou a sua! Então está provado que ela funciona. E é isso que vou fazer: tirar, de cada um de vocês, a parte de talento que quero. Taylor, sua meiguice e capacidade de compor letras me inspiram, e o amor que conquista por onde passa é invejável; Barry e Tyler, suas experiências e vozes que alcançam dificílimos tons a muito me agradam, e me ajudarão a atingir um público mais velho. A disposição que têm também é um prato cheio para um homem não mais tão jovem como este que vos fala; Pitbull, não conheço artista tão bem cotado para parcerias, e quero esse seu toque de simpatia e poder social do qual parece gozar; Adele, minha doce Adele, não existe voz mais potente nesta terra! Quero o poder de sua voz!; Meus caros membros do SHINee, adoro o estilo de vocês, e, oh, como dançam bem! Com vocês serei o rei dos videoclipes e poderei atingir público asiático! E, por fim, Harry, na falta da banda, o mais popular serve. Quero seu encanto com as garotas, o timbre rouco da voz, seu sotaque britânico e, quem sabe, não herdo um pouco da beleza que – apesar de não enxerga-la em você – faz descabelarem-se milhares de garotas no mundo todo!
Taylor Swift começou a chorar.
– Não chore, minha bela Taylor! Você estará fazendo sua maior caridade! Não fica feliz?
– Você é um monstro! – Falou Pitbull. – Não há pessoa mais horrenda no mundo!
– E nossos fãs? Jamais conseguirá arcar com a ira deles! – Falou Harry.
– Ora, ora, Harry! – Ele esboçou um sorriso. – Quando um artista que envolve todos os talentos e capacidades de alguns dos maiores artistas do planeta surgir, você realmente acha que sentirão falta dos antigos? – O esboço do sorriso adquiriu caráter sarcástico.
A tensão tomou conta de nós novamente. Eusébio encarou um por um, e sorriu novamente no final.
– Podem leva-los rapazes! Os deixem à vontade, sim? Mas, ao primeiro sinal de revolta, por favor, podem leva-los para o Quarto Branco. 
Senti Brutus apertar com força o meu braço, enquanto voltava-nos para a porta por onde havíamos entrado.
Olhei rapidamente para o rosto de meus companheiros de corrente. Medo e desespero era o que transpassavam aqueles rostos. Estávamos lidando, sem dúvida, com um louco. E um dos piores loucos!
Olhei para Harry. Ele também estava com medo, mas ao perceber meu olhar, fechou a expressão e virou a cara. Não pude acreditar! Mesmo com aquela situação louca, a qual ELE me havia “arrastado” à ela, ele ainda achava energia e rancor para ter raiva de mim.
Saímos da sala e viramos à direita na primeira bifurcação do corredor. Ainda antes de sermos postos com um empurrão em outra sala, pude ouvir o grito eufórico e raivoso de nosso maluco raptor:
– Robim! Seu imbecil! Sua azeitona estragada, comida de vermes! Como pôde deixar cair vinho no meu terno novo!



2 comentários: