Eu on.
Grrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr...
O barulho que
me fez congelar eccou novamente em meus ouvidos.
Virei muito
lentamente minha cabeça e constatei a presença de um gato. Era um gato muito
branco, por isso consegui enxerga-lo no escuro. Ele arreganhava os dentes e
mostrava as afiadas unhas para mim, seu pelos e rabo eriçados.
Continuou
fazendo o barulho.
Grrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr...
Mordi a língua
e cruzei os dedos, enquanto ele rosnava mais uma vez para mim. E, como se não
bastasse a ameaça do gato, ouvi muito próxima a voz de Eusébio.
– Napoleão, é
você rapaz? Que está havendo? Por que está rosnando? Onde você está? Embaixo da
cama de novo?
Vi por baixo
da colcha que cobria a cama a sombra dos pés de Eusébio, se abaixando para
erguer a barra da colcha e verificar o que estava acontecendo. Ele estava
levantando a barra do outro lado, do lado onde estava o gato, e automaticamente
eu rolei para fora de meu esconderijo e corri muito silenciosamente para trás
da poltrona na parede à direita.
Escutei o
roçar de seus braços no carpete e os ganidos do gato em seu colo, que se
debatia.
– Napoleão,
sei que está tentando dominar a Europa, mas não precisa fingir que o inimigo
está embaixo da cama, espreitando o tempo todo, seu gato maluco...
Pensei se era
o gato o mais maluco naquele quarto. Eu com certeza não concordava com aquela
opinião.
- Venha, deite
na poltrona, eu sei que você gosta muito dela, e trate de sossegar. Amanhã
teremos muito o que comemorar meu amigo.
Me encolhi
ainda mais enquanto sentia sua aproximação à poltrona, e prendi a respiração
quando ele colocou o gato em cima dela, a centímetros de minha cabeça.
Depois ele
saiu e apagou a luz do aposento, retornando à cozinha. Ouvi o barulho da
geladeira e depois seus passos indo para a sala.
Napoleão
levantou-se da cadeira e pulou no chão. Ouvi seu nariz roçando no carpete.
Ele voltou até a cama e depois começou a se encaminhar de volta para a
poltrona, mas eu sentia que não era para voltar a se deitar nela.
Precisava
pensar, e rápido. Não tinha nada que eu pudesse fazer para escapar.
No escuro,
virei-me e senti uma coisa redonda e dura bater em minha perna. Tateei por ela
no chão e a encontrei. Era uma bolinha, e deveria pertencer a Napoleão.
Se pensar duas
vezes, empurrei a poltrona com violência para frente com meus pés e joguei a
bolinha para o corredor que dava passagem do quarto à cozinha e à sala.
Consegui o
efeito esperado.
O gato seguiu
a bolinha, com seu instinto predador. Devido ao empurrão que eu dera na
poltrona, o que aguçou sua mente, ele seguiu o
primeiro movimento que viu.
Levantei-me num
ímpeto e, ainda no escuro, abri uma das portas do guarda-roupa e a fechei, me
aninhando em seu interior o mais encolhida que pude. Senti vários casacos
cobrindo quase totalmente o meu corpo, o que me deixou com uma maior sensação
de segurança. Para melhorar, estava sentada sobre algo alto e macio. Eram
cobertores. Para me sentir ainda mais segura, levantei o primeiro e me encolhi
embaixo dele. Estava frio e eu me senti tanto mais segura como mais quente.
Ouvi, dentro
de instantes, Eusébio nervoso, acendendo a luz do quarto, brigando com
Napoleão:
– Gato mau,
muito mau! Ora! O que você fez na poltrona seu animal?! Como conseguiu isso?
Ah, não importa, você já fez muita arte por hoje! Devolve essa bolinha agora.
Isso, trate mesmo de subir nesta cama, seu gato maluco, estúpido e ignóbil!
Hunf!
Ouvi Eusébio
colocar alguma coisa na cama, que pensei ser o gato. Depois, congelei
novamente. Ouvi Eusébio abrir uma porta do armário, muito perto de mim.
– Onde está
meu pijama? – Ouvi a voz abafada dele.
Mais uma vez o
barulho de porta se abrindo e se fechando. E mais uma. Percebi que a minha
porta era a próxima.
Havia cruzado
os dedos e já estava sentindo o vento do lado de fora do armário entrar no
interior do guarda-roupa quando...
– É mesmo! Os
pijamas estão na sexta porta! – escutei-o dizer, enquanto ele fechava a porta
e, a duas portas de mim, calculei, ele encontrou os pijamas.
Respirei
aliviada.
Ele já devia
ter colocado o pijama, e deduzi que seus passos estavam indo em direção ao interruptor de luz,
o que concluí ser verdade, pois logo elas se apagaram.
Escutei com
uma sensação de felicidade imensa ele levantar sua colcha de cetim e
recostar-se nos travesseiros.
– Vamos ver TV
Napoleão? – Ele disse, mas eu não ouvi o barulho de aparelho algum sendo
ligado.
Em vez disso...
– Nossa, como
está frio! Vou pegar uma coberta para nós rapaz! – Ele se levantou da cama e
seus passos caminharam em direção ao guarda-roupa novamente.
Ah, não! Agora
não haveria escapatória. Eu sabia que ele estava indo até a porta onde eu
estava escondida, e quando pegasse o primeiro cobertor, aquele sob o qual eu me
encontrava, eu seria desmascarada.
Tentava
desesperadamente pensar em alguma coisa quando senti o frio inundar o interior
do armário novamente, e uma mão segurar a borda da coberta, a centímetros de
meu braço.
Mas, o que
veio em seguida, nem eu nem Eusébio esperávamos.
Um som alto e
ensurdecedor irrompeu pelo quarto, fazendo meus tímpanos vibrarem fortemente.
Senti Eusébio
soltar a colcha e sair correndo porta afora, seguido por Napoleão.
Ouvi vários
passos pelo mesmo corredor e, quando eles pareceram silenciar, uns dois minutos
depois, tirei o cobertor e vi pela porta do armário aberta a porta do quarto,
também aberta, que dava para um corredor.
Não hesitei e
saí correndo para ela.
Antes de sair
para o corredor, espiei. Tudo estava muito quieto e o corredor estava vazio.
Pelo som dos
passos, eles, Eusébio e provavelmente seus guardas, haviam ido para a direita.
Por isso, eu
fui pela esquerda.
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